terça-feira, julho 02, 2019

Diário de um peladeiro VII


A pelada está ficando mais competitiva. Só restaram eu e mais um mais velhos. Todos os outros tem menos de 30. Provavelmente menos de 25 anos.
Ainda não voltei para a academia, mas a tendinite do pé parece ter melhorado. O que praticamente libera a academia.
A falta da academia está ficando cada vez mais gritante. Mas terminado o Carnaval, posso voltar a malhar.
Sobre a pelada em si. Foi ótima. Povo animado. É bom quando se conhece todo mundo. Quando fiz um gol, até quem estava no outro time veio me cumprimentar.
Recebi a bola em boa posição de costas para o gol 5 vezes. Apenas na quarta, consegui girar e chutar. A bola foi para fora. Na quinta, girei, dei um toquinho na bola para ajeitar e chutei com tanta força que ouvi a bola zinir. Estava bem fora da área do lado esquerdo. A bola entrou a esquerda do goleiro que nem esboçou reação.
No total deu para fazer algumas boas jogadas, mas meu fôlego está uma merda. Contei pelo menos uns 3 gols do adversário que não teriam acontecido se eu estivesse posicionado corretamente. Para fazer isso, preciso de fôlego. O tal do oxigênio, já ouviu falar?
Receber a bola e girar para o gol, ou mesmo matar a bola e jogar de pivô era algo que eu fazia com facilidade 30 anos atrás. Não creio que seja o problema na coluna, mas simplesmente falta de treino.Jogar bola nos finais de semana é bem diferente de treinar numa escolinha todo dia e ter uma casa com três campos de futebol como era no Moinho de Vento. Preciso mudar isso...
No total, o desempenho neste início do ano tá bem mediano se levar em conta a péssima condição física.
Resumo:
Três finalizações. Uma assistência.
Quando catei fiz duas boas defesas.
Saldo: 7 jogos 5 gol

Diário de um peladeiro - Parte V


Quinta partida do ano. Como o SUS de Juiz de Fora é uma das piores coisas que já inventaram na humanidade, não consigo ser atendido há mais de um mês. Fui na terça só para o médico falar que tinha me mandado para o lugar errado.
Enquanto isso, já que a dor continua moderada, vou continuar jogando meu belo futebol.
A partida de hoje começou uma porcaria porque eu passei a semana dopado de remédio para dor, depressão e estresse pós traumático. Joguei mal.
Felizmente, esse estresse gera um ódio violento e como já dizia Darth Vader, o ódio dá forças.
Nos últimos 15 minutos de peladas, perdíamos por 4x0 em uma partida valendo 5. 
Dei uma assistência de calcanhar e e fiz dois gols, Um de carrinho e uma bomba de fora da área.
Antes havia dado mais uma assistência. 
Saí feliz. Mas ainda cheio de ódio. Se encontrasse alguns políticos e outro idiotas com quem já trabalhei, acho que esquartejava com minhas próprias mãos.
Resumo:
8 chutes a gol
3 assistências
2 gols
Saldo: 5 jogos - 4 gols
Tem que melhorar ainda.

Diário de um peladeiro - Parte 4


Para quem chegou agora. Resolvi fazer estes relatos por uma questão de comprometimento com minha saúde. Se a gente registra as coisas, dá para mensurar e comparar. Entender o que está fazendo de certo e de errado.
Lembrando que sou um peladeiro agora. Mas vou levar isso como se estivesse de volta na escolinha do Voltaço ou em São Januário. Por que? Porque é divertido. 
Vamos lá. Quarta pelada do ano. Melhor performance até agora. Mas entendi que, se quiser continuar com isso, vou ter que emagrecer, muito ou vai ser um processo de auto destruição física e não de saúde.
A tendinite no pé esquerdo piorou. Botei gelo a tarde toda. O fato é que eu não tinha cuidado disso direito. Vou no ortopedista na terça. 
A coluna também tá doendo demais. A radiografia mostra que a protusão piorou, talvez tenha se transformado numa hérnia. Só ressonância para saber. Vou fazer na semana que vem. 
Sobre a pelada em si. Fiz um gol. Dei três assistências. Perdi um dos gols mais impossíveis de perder da minha vida e, quando catei, tomei o maior frango desde que voltei a jogar futebol em 2015.
Mas gostei da performance e os meus companheiros de pelada assinaram embaixo. O gol foi bonito. Driblei duas pessoas antes de chutar. A bola não saiu tão forte, mas enganou o goleiro. 
Dei alguns dribles. Fui mas seguro com a bola. Continuo errando muitos passes, mas acertei o suficiente para dar três assistências para gol. Chutei umas seis vezes para o gol. Um dos chutes foi tão forte, mas tão em cima do goleiro que acho que ele machucou.

Saldo de 2019 até agora.
Quatro partidas. Dois gols.

Diário de um peladeiro - II

Segunda pelada do ano
Local Faculdade de Educação Física da UFJF - Faefid
Saldo:
Nenhum gol
1 assistência
2 finalizações
Catei no gol: duas defesas
Desempenho bastante aceitável levando em conta que o calor insuportável.
Comentários:
Uma das coisas que mais gosto no futebol é como ele consegue refletir meu estado de espírito no dia. Tive duas chances seguidas de chutar para o gol hoje e nas duas preferi tocar para alguém não necessariamente melhor colocado. Parece que faltou coragem. Claro que o calor influenciou. Difícil pensar em final de pelada.
Curiosidade: 
Terça-feira joguei no Tupi. No Centro da cidade. Área mais baixo. Segundo o mapa topográfico está a 679 metros acima do nível do mar.
Hoje, a Faefid fica num dos lugares mais altos: 980 metros. Será que era só o calor ou 300 metros de altura fazem alguma diferença?

segunda-feira, abril 22, 2019

Han Solo – Uma história de Star Wars


Filme Solo de Han Solo se esforça e consegue ser o primeiro grande fracasso de público e crítica de Star Wars depois de 40 anos




O jovem Han (Alden Ehrenreich ) foge de seu planeta natal, Corelia, mas não consegue levar a namoradinha, Kira (Emilia Clarke) e ela é presa pelo Império. Para salvar a própria pele, ele ainda tem que se alistar no mesmo Império Galáctico. Três anos depois, com a ajuda de um novo amigo, Chewbacca, consegue se juntar a uma gangue de trapaceiros golpistas comandada por Beckett (Woody Harrelson) e copiada da turma do Dominic Toretto de Velozes e Furiosos. Daí, eles tentam um golpe estilo Torreto que não dá certo. Agora eles têm que prestar contas ao contratante.  Acontece que o contratante também é o chefe de quem? Kira!  Ah, sim! Por um acaso do roteiro, Kira, agora é o braço direito justamente do cara que contrata regularmente os serviços desta  gangue. Sim, Campeão, tu perdia sua mãe no supermercado, mas o Han Solo, no meio de uma galáxia inteira, dá de cara com Kira por mera coincidência. Afinal, uma galáxia é um lugar pequeno...

O roteiro vai ficando confuso. Porque Kira é para ser misteriosa e por isso, ela tem várias oportunidades de explicar para Han quem ela era agora. Mas ela prefere ficar fazendo cara de misteriosa. Afinal, o roteiro precisa que ela seja misteriosa.

Aí, ela vai junto numa missão arriscada para que eles paguem o que devem ao grande vilão, interpretado por Paul Bettany. Depois descobrimos que ela não precisava ir. Porque o roteiro dá a entender depois  que ela é a segunda no comando. Não precisava sujar as mãos. Mas ela também é escrava do vilão, embora, fique claro que ela podia dar uma surra nele na hora que quisesse e assumir seu lugar. Por que não fez antes?  Porque o roteiro quis assim. Mas tudo bem, voltemos à missão.

 Para executar a missão, eles precisam de uma nave rápida e encontram Lando Calríssian, uma ótima presença de Donald Glover. O plano de Han é ganhar a nave de Lando, o poderoso Millenium Falcon num jogo de Sabacc. Novamente o plano não dá certo, mas Lando resolve ir junto também na arriscada missão impossível do grupo porque... O roteiro diz que sim e lá vamos nós numa aventura interessante e divertida, mas que, na maioria das vezes, você precisa esquecer a lógica para curtir.



Rever um ano depois



Desapontado com o filme. Encontrei um grupo de fãs recentemente que disse ter adorado. Bom, gosto não se discute. Mas pensei comigo. Vai que eu me enganei? Posso ter criado expectativas. Assim, um ano depois, resolvi rever o famigerado mega fracasso da Disney e primeiro filme de Star Wars a dar prejuízo em todos os tempos.

O resultado? Bom, achei bem pior agora, olhando friamente, do que um ano atrás. Vamos às impressões.



A jornada do roteiro de um filme

Logo no começo do filme, uma coisa já começa a incomodar. Todo professor de roteiro, seja ele de tevê, cinema, teatro, ou mesmo de um livro, vai dizer a mesma coisa: “É muito melhor mostrar do que dizer”. Tem horas que não dá para fugir do diálogo expositivo, claro. Mas a motivação do personagem é uma peça fundamental de toda obra impactante. Por isso é estranho, muito estranho, que um roteiro feito pelo grande mestre Lawrence Kasdan e seu filho Jonathan Kasdan, prefira colocar o jovem Han Solo repetindo várias vezes que quer ser um grande piloto, sem nunca mostrar uma real motivação. Uma cena de Solo admirando uma nave ou coisa parecida já servia. Confesso que fiquei com uma curiosidade que não tinha. Por que diabos ele quer tanto ser piloto?

Ou seja, se o filme responde perguntas que os fãs não queriam respostas. Ele ainda coloca mais perguntas na cabeça da gente  e não dá respostas.

Uma fanfic do escritor brasileiro da ficção científica, Jorge Calife, sobre Wedge Antilles, um dos venerados personagens secundários da trilogia clássica de Star Wars, vivido por Denis Lawson, mostra de forma sutil e poética, como o jovem Wedge quando menino entrou clandestino em um cargueiro e ficou fascinado com as viagens espaciais, antes de ser pego. Neste singelo exercício de imaginação, Calife nos mostra como seria a motivação da carreira do único piloto a participar ativamente da destruição das duas estrelas da morte. Se filmada, possivelmente não duraria nem 5 minutos na tela e seria deliciosa de ver.

Mas o filme de Han Solo não está nem aí para sutilezas. A melhor palavra que pensei para definir o roteiro é desengonçado. E as confusões nos bastidores não nos deixa saber até onde a direção do irregular Ron Howard conseguiu ajudar ou atrapalhar. O fato é que o excesso de tentativas de reviravoltas prejudica, porque não são realmente interessantes e chegam a cansar.

Para não dizer que não tem nada de bom no roteiro, o fato é que há uma profusão de fan-service jogados na tela o tempo todo e isso é realmente divertido. Talvez seja isso que agradou a alguns fãs. Eu também gostei.

Mas aí, a parte mais corajosa de tentar responder perguntas que os fãs não fizeram e que seria o ponto alto do filme caso se desse certo.  Mas não deu.



A grande aposta da produção



Muitos vão dizer que Solo foi uma aposta arriscada ao mexer com um personagem icônico. Entretanto, por mais que houvesse pirraça dos fãs antes da produção, o fato é que todo fã queria mesmo um bom filme do personagem. Star Wars está no manual de qualquer professor de roteiro e nele você sempre vai achar uma citação a Han Solo, pois ele é a cristalização do conceito de amigo do herói que dá a liberdade ao escritor ou roteirista de criar sem as amarras do herói. Han Solo não precisa ser nobre, não precisa ser sábio, nem gentil, nem educado. Por isso mesmo, é um personagem mais livre que Luke. Algumas “imitações” de Han Solo fizeram história. Basta lembrar o caso de Jack Sparrow, em Piratas do Caribe, que era o Han Solo de Will Turner e acabou roubando a franquia inteira. Para muitos fãs, Han Solo era mais popular que Luke. Tanto que o ator Harrisson Ford virou astro supremo de Hollywood, enquanto Mark Hamill ficou quase na obscuridade, apesar do talento que revelou no teatro e como dublador.

Aliás, a imagem de Harrisson Ford, o maior astro das décadas de 80 e 90, também assombrava a produção. Então, não se tratava apenas de arrumar um novo Han Solo, precisavam sair da sombra de Harrisson Ford. Tarefa nada fácil.

Como o cara que mais se apresentava como o “herdeiro” de Ford, Chris Pratt já estava atarefado, tiveram que arrumar um genérico.

Alden Ehrenreich começa com um grande problema de nove centímetros... Calma, estou falando da altura dele.  Ele tem 1,76 de altura. É mais baixo que eu. Ford tem 1,85. (Só de curiosidade, Pratt 1,88)

Já que vai ter que apelar para a suspenção de descrença do público. Tiveram uma ideia que eu achei ótima. Vamos continuar seguindo a linha da Marvel e seu MCU, ou seja, chamar diretores diferentes para os filmes, dando liberdade para colocar seu toque pessoal. Chamaram os caras que fizeram Anjos da Lei, Phil Lord, Christopher Miller. Os caras pretendiam fazer uma mistura de aventura e comédia.

Achei uma boa ideia. Han e Lando fazendo uma “dupla do barulho”. Realmente há várias situações no produto final que parecem puxar para o lado da comédia, mas como resolveram ser sérios, a coisa ficou esquisita. O exemplo é o encontro entre Han e Chewei. Que parece pensado como piada.

 Quando pegam a robô militante pelos “direitos dos robôs” e enfiam seus restos mortais na Falcon, parece ser outro caso de uma cena foi pensada como uma atitude maluca que seria engraçada em Anjos da Lei, mas ali, ficou parecendo apenas que Lando teve um luto de 5 minutos e depois usou o cadáver da amada para consertar um computador. Ficou até uma cena de mau gosto, que talvez funcionasse numa comédia de humor negro.

Não sei o que se passou no set de filmagem. Sei apenas que houve conflito entre o ator e os diretores e a Kethleen Kennedy, a produtora, entrou na briga. Chamou outro diretor, Ron Roward para consertar. Roward veio com a marra de quem já tem um Oscar na prateleira e de já ser “de casa”. Mas é um diretor irregular.

Hoje é impossível dizer se o filme de Phil Lord e Christopher Miller seria melhor. Mas não custa lembrar que Phil Lord ganhou um Oscar este ano porque produziu e escreveu um tal de Homem-Aranha no Aranhaverso. Bom, o leite já tá derramado, né?

Já havia acontecido coisa parecida em Rogue One, com Kethleen Kennedy entrando de sola e mandando modificar o filme, mas o resultado parece que foi ótimo. Ao menos eu adorei o filme e ele fez grana pracaramba.



No final, o roteiro de Lawrence Kasdan e filho, não foge da proposta desafiadora, que era responder as perguntas que ninguém queria que respondessem. O problema é que as respostas são ruins. Por exemplo:

1.       De onde veio o nome Solo?

Resposta: era o sobrenome do cara, ponto. Quem quer saber isso?

Resposta do filme: um maluco precisa preencher um formulário com o sobrenome do Han e ele não tem sobrenome. “Ah, você é sozinho? Então vou escrever Solo”. Funcionaria numa comédia? Talvez... Fiquei com a impressão que o roteiro foi pensado como uma comédia mas foi refilmado por Ron Roward de outra forma.

Para os fãs da saga, a coisa fica mais esquisita. Pois, fica claro que, Han e a princesa Leia tiveram um filho e resolveram batizá-lo com dois nomes falsos: Ben e Solo!

Para quem não sabe, Ben, era o nome falso adotado por Obi Wan Kenobi no primeiro filme Star Wars.

2.       O que era a Corrida de Kessel?

Resposta: vários fãs, incluindo cientistas tentaram responder essa questão. Afinal, Lucas usa parsec, uma medida de distância, como se fosse uma medida de tempo. Então, a maior expectativa em relação ao  filme de muitos fãs mais ligados a ficção científica, era como seria resolvida essa questão?

Resposta do filme: aproveitaram a deixa dos fãs e realmente colocaram que o grande lance da Milleniun Falcon era o poder de processamento do computador e não a velocidade da nave. Algo que realmente faz sentido do ponto de vista científico. Mas fizeram da rota de Kessel algo nebuloso (trocadilho involuntário pois ela se passa numa nebulosa) e não há por que alguém dizer que a nave ficou famosa por conta disso. Não foi uma corrida, ninguém viu. Foi um roubo. Se foi um roubo, Han já seria um cara muito mais procurado na galáxia, caso ficasse famoso. Ou seja, nada faz muito sentido.

3.       Por que a Milleniun Falcom é tão rápida?

Resposta: ninguém quer saber

Resposta do filme: havia um robô L3-37 com grande capacidade de processamento. Esse robô sonhava com direitos iguais, achava que os droids precisavam ter liberdade como os humanos. E mantinha uma relação platônica com Lando.  Quando o robô morre, Lando e Han pegam o processador dela, praticamente a alma do robô e integram a espaçonave. Deixando um robô, que sonhava com liberdade, eternamente escravizado numa nave. Sim, a Milleniun Falcon não é mais a nave símbolo da luta pela liberdade. É um aparelho que tortura eternamente uma criatura. Star Wars fazendo piada com tortura? Sério?

Enfim, o fato é que, com decisões infelizes e um roteiro atrapalhado, Han Solo decretou de vez que os estúdios Disney fariam uma pausa (um hiato) após o Episódio 9 para poder pensar as coisas direito antes de executar. Para isso o filme serviu.

Tem algo que se salva?

Se você não tem o hábito de pensar se a história faz sentido ou não, talvez você curta. Há muitos filmes assim.

Alden Ehrenreich e Donald Glover mostram competência em seus personagens. Pena que a dinâmica entre os dois é mal aproveitada. A grande surpresa boa do filme é justamente a participação mais efetiva de Chewbacca que até então era um dos personagens mais mal aproveitados na saga.

O filme tem um ponto em que realmente decola, principalmente na tão falada rota de Kessel, mas depois o ritmo volta a variar e a necessidade de enfiar viradas no roteiro acaba cansando. O roteiro telegrafa várias vezes que alguém vai trair Han Solo.

 As duas grandes viradas são feitas por motivações vazias. Dois personagens traem Han Solo porque o roteiro precisa ou assim o quer. Não havia motivos sólidos para as traições. E se havia, ambos os personagens claramente gostavam de Han e gostavam muito. E ambos tiveram tempo para que, se quisessem, conversar com Han. Mas o roteiro...

E Han tem um arco de virar um bom moço exatamente igual ao de Uma Nova Esperança. Ou seja, ele sempre foi bom moço. Segundo este filme, o que se viu em Uma Nova Esperança era falso? Não, na verdade, parece que o filme foi pensado como o primeiro de uma série de filmes do Han Solo, ou talvez emendando com outro filme sobre o Lando. Como não aconteceram, muita coisa ficou no ar. Muitos ganchos que provavelmente nunca vão ser conectados.

E é inegável que o fracasso de crítica e o desânimo dos fãs com o esquisito The Last Jedi ajudou a espantar parte do público, mas o fracasso de Han Solo é mérito próprio. O primeiro Star Wars a dar prejuízo na história do cinema. Vamos torcer para que os produtores tenham aprendido a lição e demore pelo menos mais 40 anos para ter outro recorde negativo.


sexta-feira, agosto 31, 2018

Beleza Oculta (Collateral Beauty, 2016)


Mais um filme de Will Smith massacrado pela crítica e fracasso de público. Será justo?


Existem alguns filmes que são prejudicados quando você injeta muito dinheiro e expectativa neles. Filmes como Oblivion(2013), por exemplo, que seria uma ótima ficção científica não fosse a necessidade de ter cenas de ação e romance forçado para virar um  “filme do Tom Cruise”. Outro exemplo recente é Passageiros(2016), que funciona maravilhosamente quando é uma ficção cientifica com dilema moral mas vira um desastre quando transformado em filme romântico para ter justificada a presença dos astros Jennifer Lawrence e Chris Pratt.

Aqui, temos um elenco recheado de atores renomados, Will Smith, Hellen Mirren, Keira Knightley, Kate Winslet, Edward Norton, Michela Peña e a direção do mesmo David Frankel de O Diabo Veste Prada e Marley e Eu. Enfim, o filme carrega em si toda banca de filme de Natal, com a promessa de uma mensagem otimista e edificante. O grande mérito, porém, de Beleza Oculta (Collateral
Beauty, 2016) é não cumprir esta promessa. E provavelmente é este mérito a razão de seu total fracasso. Dá para suspeitar que talvez o mérito seja acidental. Parece que queriam mesmo fazer um filme “para cima” sobre um pai que perde a filha de seis anos. Por sorte, não conseguiram. Seria desonesto. O resultado, porém, cumpre a função de “lição de vida” de forma muito mais verdadeira e eficiente. Resumindo, se eu tivesse que aconselhar um filme para quem sofreu uma grande perda, jamais recomendaria A Cabana (The Shack, 2017), mas recomendaria muito Beleza Oculta. Confesso que só insisti em ver por teimosia. A crítica detonou implacavelmente e o público também foi fraco. Entretanto, logo de cara dá para entender que parte do problema do filme foi o trailer e como ele foi vendido. A história nos mostra, Howard Inlet ( Will Smith), que cai em uma depressão monstruosa quando perde sua filha de seis anos (algo muito semelhante ao plot de A Cabana).  Sua falta de vontade e revolta com tudo e com todos começa a levar para o buraco sua firma de publicidade. Seus sócios desesperados se sentem impotentes quando veem a beira da falência e resolvem contratar uma detetive para segui-lo e provar que ele está fora de suas faculdades mentais. Assim, podem ao menos vender a firma e salvar alguma coisa.
A detetive descobre que Howard, como forma de lidar com a dor, envia cartas desaforadas para três elementos do universo: a morte, o tempo e o amor. Os amigos então, resgatam as cartas e contratam três atores para se fazer passar pelos respectivos elementos. Assim, podem talvez possam ajudar Howard e, principalmente, ajudar a si mesmos, provando que ele não anda bem da
cabeça e obriga-lo a vender a firma.
Sim, normalmente eu não dou spoiler, mas o trailer vendia exatamente um filme em que Will Smith escreve cartas para a morte, o amor e o tempo e estes respondem para conversar sobre a vida, o universo e tudo mais, assim, ajuda-lo a superar o trauma. Não, isso na prática não acontece no filme.  Aos 5 minutos de filme a promessa do trailer cai por terra e realmente não me admira que o expectador e os críticos se sintam enganados.
Mas resolvi dar uma chance e ver o filme até o fim. O resultado é que curti muito. Primeiro que a graça está justamente na rima da história. Os atores/elementos contratados conseguem até conversar e, até certo ponto, ajudar Howard.  Mas são os amigos dele quem realmente precisam de ajuda e são eles que vão ser realmente ajudados pela morte, pelo tempo e pelo amor.
Claire(Kate Winslet) se sente velha para ter filhos, pois dedicou sua vida ao trabalho. Essa frustração dela em relação ao Tempo (Jacob Latimore) é muito mais interessante e justificada que com o problema de Howard com o mesmo.
Já With (Edward Norton), o melhor amigo de Howard, traiu a esposa e, com isso, perdeu o casamento e também o amor de sua filha. Assim, é ele quem vai ter que ajustar contas com o Amor (Keira Knightley).
E finalmente, Simon (Micheal Peña) está com um câncer terminal e pronto para ajustar as contas com a Morte (Hellen Miren).
Assim, o filme nos conduz a uma jornada pelos personagens secundários enquanto Will Smith ancora tudo jogando água no chope dos argumentos positivos dos “elementos”. E os seus questionamentos são pertinente em diálogos, no mínimo, inteligentes. Enquanto isso, Howard tenta participar de um grupo de apoio e é lá, com uma amiga, que ele consegue reunir forças para tocar a vida e encarar finalmente a sua trágica realidade.
O filme não é perfeito. Sofre da nova síndrome de Netflix, quando você sai com a impressão de ter visto algo que daria uma ótima primeira temporada de uma boa série, mas que em filme as coisas ficam pouco desenvolvidas. No caso, é fundamental conhecer e simpatizar com os personagens
secundários e entender seus dramas e há pouco tempo para desenvolver isso.
Confesso que só entendi o drama da personagem de Kate Winslet no final. Achei que With seria uma espécie de vilão e Micheal Peña merecia mais tempo em cena. A necessidade de manter o foco em Will Smith a maior parte do tempo prejudica o longa já que, a história dele é apenas a condutora.
A filha de With, Allisson (Kylie Rogers), é ótima atriz, e o drama apresentado por ela é verdadeiro, mas é difícil engolir uma menina de 9 anos falando como uma psicóloga formada de 26 anos. A resolução entre ele e a filha só sai porque o filme não tinha mais tempo.
No final das contas, dá para entender o ranço da crítica, mas não concordo se tratar de um filme desonesto. Beleza Oculta é um filme que tem algo a dizer e traz ótimas interpretações de todo o elenco. Trata de um assunto sério e pesado com responsabilidade, sem apelos religiosos. O elemento metafísico aparece, mas deixa o julgamento ao espectador. Será que são realmente atores? Ou será que o tempo, o amor e a morte realmente estavam ali?
No final, não temos respostas fáceis, mas uma esperança honesta e madura. Se tivesse sido feito com um orçamento apertado e atores desconhecidos, provavelmente seria muito elogiado.



quinta-feira, junho 14, 2018

Eu não sou um homem fácil




Filme francês diverte usando universo invertido entre homens e mulheres



Damien (Vincent Elbaz) é um típico solteirão machista, estilo cafajeste, vaidoso e egocêntrico que trabalha em uma empresa de software. Ele está feliz transando com várias mulheres, dando cantadas na rua, no bar, na livraria, no trabalho, em toda parte. Mas a vida é uma caixinha de surpresas e, numa bela manhã de sol, após conhecer a secretária de seu melhor amigo, Alexandra (Marie-Sophie Ferdane), numa livraria, ele bate a cabeça num poste na rua e desmaia. Ao recobrar a consciência, ele descobre que está em um mundo invertido. Não, não é o de Stranger Things, mas uma sociedade matriarcal em que as funções entre homens e mulheres são invertidas, ou seja, são os homens que precisam “prestar contas à sociedade”, se vestir com roupas apertadas e sexistas. Precisam se depilar, fazer as unhas, usar rosa e flores (lembrei do Menudo, pesquisem no Google sobre do que se trata).

A princípio Damien até gosta da ideia de ser cantado na rua por todas as mulheres. Mas depois o pesadelo vai mostrando seu lado cada vez mais sinistro. Seus pais cobram o fato dele ser solteiro, promíscuo e não ter filhos e acham um absurdo seu discurso sobre como um homem pode ser feliz sem ser casado. No serviço, acaba demitido por “não saber o seu lugar diante da chefe”. O seu melhor amigo, antes um admirado escritor, agora é um passivo, recatado e do lar.

Damien  até que tenta se adaptar ao novo mundo: depila o corpo completamente, pinta as unhas, compra roupas que mostram mais as pernas (depiladas) e consegue um novo emprego, justamente como secretário de Alexandra que, neste mundo é basicamente uma versão feminina dele mesmo, uma colecionadora de homens egocêntrica e que vê em Damien um homem difícil de ser conquistado e, portanto, um prêmio a ser disputado.


Um pouco além de comédia, mas não muito


Escrito e dirigido por Eléonore Pourriat, Eu não sou um homem fácil é uma boa surpresa do Netflix. A produção francesa estreou em junho e pega leve em um tema muito atual, mesmo assim, vale a pena ser visto tanto por homens quanto por mulheres. O entretenimento é garantido principalmente pelas atuações de Vincent Elbaz e Marie-Sophie Ferdane. O primeiro convence como machista que vai se adaptando a nova condição de oprimido e a segunda como uma “mulher cafajeste”.

O filme opta por um caminho mais leve, lembrando muito mais o  constrangedor Do que as mulheres gostam, de 2000, com Mel Gibson, sobre um machista que descobre ter o poder de ler o pensamento das mulheres e passa longe do genial, A Cor da Fúria, de 1995, com John Travolta em um mundo invertido onde os negros são a casta superior e os brancos marginalizados.

O problema é que, o racismo contra negros é algo relativamente novo em termos históricos, datando da época da escravidão há 300 anos e agravado com as teorias eugênicas dos Séculos XIX e XX. A simples inversão dos papeis no filme de 1995 é suficiente para mostrar o absurdo da sociedade e causar incômodo e até, no meu caso, náuseas.

Já a situação da sociedade patriarcal remonta no mínimo uns 100 mil anos e não se restringe ao ser humano. Na verdade, a maioria das espécies de animais possui uma divisão da função entre machos e fêmeas e cada uma com características peculiares que foram, ou não, assimiladas pela raça humana. A simples inversão do papel não resolve o problema e ainda corre o risco de entrar no erro mais comum de pessoas leigas de pensar que o feminismo é apenas o contrário de machismo. (O contrário do machismo é a inteligência, caso alguém não saiba).

Por outro lado, a inversão dos papeis demonstra claramente que o mau-caratismo e a falta de consideração com os sentimentos das outras pessoas não é, infelizmente, apenas uma prorrogativa masculina, mas que a sociedade é mais tolerante com determinados deslizes de caráter de um gênero em detrimento de outro.


Faz rir, faz pensar e faz torcer


Mas se o filme não dá um parecer definitivo sobre as relações de poder entre machos e fêmeas da raça humana, ao menos consegue brincar com os clichês do gênero. E no momento em que fica claro a opção da narrativa por ser uma comédia romântica, confesso que fiquei até aliviado, já que o roteiro vinha se mostrando muito leve para um assunto tão pesado. Quando escolhe ser um estudo superficial, o filme se despe da pretensão de ser um tratado sobre o assunto e deixa claro que quer apenas divertir com um pouco de reflexão.

Neste contexto é fascinante como a direção aproveita os clichês do gênero comédia romântica para brincar e criticar a realidade. Quando Alexandra, por exemplo, percebe que Damien entende realmente de carros, ela começa realmente se apaixonar por ele, afinal, ele não é só um homem superficial preocupado apenas com moda e com a aparência. Ao mesmo tempo, mesmo sabendo e condenando as atitudes canalhas de Alexandra, ele não resiste a dar uma volta no carrão dela. Este momento beira o brilhantismo porque deixa claro que a diretora não vai ser condescendente com ninguém.

A piada sobre os “peitos pequenos” de Alexandra, os quais ela parece querer compensar com carrões e demonstrações de poder, também é digna de aplausos.

Os gays mostrados no mundo invertido também são um ponto alto. Trata-se apenas de homens e mulheres que se vestem de um jeito que a nossa sociedade acharia normal. Mas eles têm que fazer isso em um lugar reservado para não chocar.


Tem hora em que erra, mas tem grandes acertos


O problema maior de Eu não sou um homem fácil está no roteiro preguiçoso. Para começar, a transição para o mundo invertido é feita com Damien batendo a cabeça numa placa de rua. Não se preocupam em dar nenhuma explicação a mais. Tá certo que não precisa, mas a cena é meio broxante. Várias situações propostas como a relação de Damien com os pais não são resolvidas, simplesmente ficam de lado.

No final, fiquei com uma sensação de que, como é uma produção falada em francês e com uma ideia muito original, vai acabar saindo uma versão americana em breve e a história será melhor contada.

E se eu falei do maior problema, o maior mérito do roteiro para mim foi saber terminar a história de maneira coerente, sem cair na pieguice e também sem cair no dramalhão deprimente. Mas para saber o final, você vai ter que ver o filme. E, acredite, este filme merece ser visto!


segunda-feira, maio 07, 2018

Cobra Kai – Série continua a história de Karatê Kid 34 anos depois




Acabei de ver Cobra Kai, continuação direta da trilogia Karatê Kid do recém-falecido diretor, John G. Avildsen. Vi o primeiro filme no cinema em 1984. A produção fez sucesso nos EUA, mas passou batida no Brasil por causa do título “A Hora da Verdade”. Não, não tinha “Karatê Kid” no título nacional do primeiro filme nos cinemas.

O sucesso no Brasil só veio quando passou na Rede Globo em um domingo. Aí sim, alguém teve a lucidez de colocar o título original antes do nacional. Aí, ficou “Karatê Kid – A Hora da Verdade”.

Quando estreou “Karatê Kid 2 – A hora da verdade continua”, faturou alto nos cinemas nacionais também. Com direito ao sucesso da música de Peter Cetera, Glory of Love que chegou a ser indica ao Oscar.

A saga fechou com “Karatê Kid 3 – O Desafio Final”, que foi o mais fraco dos filmes. Com uma história bem surreal e situações de luta que expuseram ainda mais o problema crônico é que Pat Morita nunca ter sido um bom lutador. O filme afundou nas bilheterias e teve péssimas avaliações da crítica.

Depois tentaram ressuscitar a série com um Karatê Kid 4 com a futura oscarizada, Hilary Swank, e fizeram um filme muito, mas muito ruim. Aí veio a ótima refilmagem produzida por Will Smith com seu filho, Jaden Smith, como o jovem que sofre Bullying e Jackie Chan como o mentor. O cenário foi transportado para a China e o filme fez sucesso, mesmo sem o charme do original, mas com personalidade própria.

Agora, é o próprio Will Smith quem também produz, ao lado de Ralph Macchio, esta série que continua diretamente a saga original.

Para quem não sabe, os filmes originais acompanhavam a vida do franzino Daniel Larusso (Ralph Macchio), criado com muita dificuldade pela mãe, Lucille (Randee Heller) - o pai morreu quando ele tinha apenas oito anos. O menino sofre bullyng dos valentões riquinhos da escola porque se envolveu com Ali (Elisabeth Shue) ex-namorada do macho alpha do pedaço, Johnny Lawrence (William Zabka).

A tensão entre o garoto franzino de origem humilde contra os valentões ricos da escola encontra um elemento chave quando o Sr. Miyagi, (Pat Morita que foi indicado ao Oscar de melhor ator coadjuvante pelo papel) zelador do prédio onde Daniel mora com a mãe, se mostra um grande mestre de artes marciais e resolve treiná-lo para enfrentar os valentões, ou o bullying como se diz hoje. O final é arrebatador quando Daniel participa de um torneio de Karatê e vence. Descobrimos que o grande vilão não é Lawrence, mas o seu mestre, Kreese (Martin Kove) dono de uma escola de Karatê chamada Cobra Kai.

Jonny reconhece a coragem e a determinação de Daniel.

Vamos lembrar que John G. Avildsen já havia ganhado o Oscar de melhor diretor por Rocky – O Lutador em 1977 e sabia como ninguém filmar dramas de superação através da luta.



Curiosidade pessoal

Quando escrevi meu primeiro romance, Fáfia – A Copa do Mundo de 2022, entre 1993 e 1995 (lancei em 1999) cheguei a escrever duas linhas brincando com uma possível continuação onde Daniel LaRusso se tornava mestre. Um personagem assistia televisão quando via um comercial de um filme: “Aos Sessenta anos, ele resolve ajudar um rapaz frágil e problemático nas milenares técnicas do Karatê! Ralf Macchio, ele agora é o mestre em KARATÊ OLD - PARTE X!”

Bom, minha profecia se concretizou parcialmente com Cobra Kai. O plot da série é muito melhor que o do filme que imaginei 25 anos atrás.



A história



Cobra Kai mostra a vida e redenção de Johnny Lawrence 34 anos depois da derrota no torneio. Temos a impressão que ele não se recuperou até hoje do chute na cara que levou do Daniel. Trata-se de um homem destruído pelo alcoolismo. Fracassado como pai e profissionalmente falido. O sucesso de Daniel LaRusso em comerciais de tevê, como empresário, só parecem aumentar seu sofrimento e sua sensação de fracasso.

A princípio é difícil enxergar o Johnny do final do primeiro filme como um derrotado. Ele aprendeu a lição e vemos que ele pega o troféu e entrega a Daniel. Mas parando para pensar dois minutos e lembro de muitos amigos e parentes que sucumbiram ao alcoolismo por conta de golpes duros na vida, Johnny perdeu a mãe e é obrigado a conviver com o padrasto idiota. Conheço pessoalmente gente que morreu por conta de alcoolismo.

De certa forma, Johnny Lawrence segue um caminho parecido com o Sr. Miyagi, que, no primeiro filme, também usa o álcool para tentar anestesiar as dores do passado envolvendo a perda de entes queridos.

E é salvando um garoto franzino, Miguel (Xolo Maridueña), de um grupo de valentões da escola que Johnny começa sua escalada rumo à redenção.

Ele reabre a escola Cobra Kai e começa inicialmente a treinar o jovem Miguel que é imigrante equatoriano. Logo vários nerds e “perdedores” da escola se juntam ao grupo de alunos do Cobra Kai. O mais fascinante é como o discurso de “Ataque primeiro”, “Não existe dor neste dojo” e “Não tenha piedade” se ajusta perfeitamente a discussão contemporânea da geração mimimi.

Neste ponto, o roteiro é extremamente inteligente ao lançar ao ar a discussão sem realmente abraçar um lado. Vemos a filosofia de Johnny dando resultados, como Eli (ótima presença de Jacob Bertrand) um jovem traumatizado com as cicatrizes deixadas por uma cirurgia de correção de lábio leporino. Johnny não tem nada de politicamente correto e ensina o jovem a enfrentar a vida agressivamente. O garoto sai, faz um cabelo moicano chamativo e uma tatuagem enorme de falcão nas costas. Depois disso, supera o trauma da cicatriz e arruma até namorada.

Cobra Kai seria uma série bem ao gosto da geração bolsominion se o roteiro não tivesse um contraponto. E é exatamente Daniel LaRusso, agora um bem sucedido empresário com uma franquia de venda de carros. Ele também tem que se virar na luta para ser um bom pai, bom marido e ainda enfrentar a concorrência agressiva.

Ao se deparar com o retorno de Johnny, do Cobra Kay, de descobrir que agora é pai de uma bela adolescente já com o primeiro namorado e dos problemas da vida empresarial, Daniel também começa a assumir uma postura agressiva.



Alertado pela esposa, Amanda (Courtney Henggeler com boa presença) seu comportamento, Daniel volta a treinar Karatê e arruma um pupilo. Não exatamente um jovem frágil e desprotegido, mas justamente Robby Keene (Tanner Buchanan), ninguém menos que o confuso, rebelde e frustrado filho de Johnny Lawrence, que, decepcionado com o pai, resolve provocá-lo indo trabalhar justamente com seu grande rival. Não, Daniel não sabe que Robby é o filho de Johnny e sim, a série usa vários destes artifícios novelescos, mas aqui até que funcionam e funcionam bem. A filha de Daniel, por exemplo, Samantha LaRusso (Mary Mouser), vai acabar namorando justamente o aprendiz de Lawrence, Miguel. E tudo vai ser resolvido novamente no mesmo torneio, que aliás, não mudou a arte gráfica e nada da sua identidade visual mesmo depois de 34 anos.

Mas estes “defeitos” acabam deixando a história ainda mais deliciosa. Johnny e Daniel são dois lados de se encarar o Karatê e a vida. Um mais agressivo, outro mais poético. Ambos os lados parecem caminhar para um equilíbrio. Johnny vai tendo seu arco de crescimento e aprendendo tanto quanto ensina aos seus alunos. Já Daniel percebe que sua vida não é tão perfeita como pensava e por momentos ele quase vira o antagonista da série. Só isso já valeria a pena assistir Cobra Kai.



Mas há também vários outros pontos positivos como as referências, às vezes forçadas, mas sempre hilárias aos anos 80 e 90, como Johnny ainda ter o mesmo carro e às vezes usar até algumas roupas velhas da época do primeiro filme. Ele também afirma não saber o que é Facebook e se irritar ao descobrir que Miguel nunca ouviu falar de Gun’s and Roses. Há boas surpresas como Randee Heller voltando ao papel de Lucille, mãe de Daniel e constantes homenagens e referências aos primeiros filmes, inclusive a inesquecível trilha sonora de Bill Conti! Tudo isso vai deliciar os fãs de Karatê Kid. Já quem não conhece... Bom, quem não conhece?



Mas a grande sacada da série é trazer Johnny Lawrence para o centro das atenções. Como se ele tivesse sido transportado dos anos 80 para cá instantaneamente com uma atuação sensacional de William Zabka que dá ao seu personagem exatamente um equilíbrio entre um cara durão irritado com sua vida e um homem em busca de consertar os erros do passado, mas sem nunca abaixar a cabeça. Ele praticamente não sorri e notamos sua alegria e satisfação com os alunos com um meio sorriso discreto. Tão pouco chora, sua interpretação é sempre contida, como se carregasse o peso dos anos de desilusões daquele jovem arrogante do filme de 1984. Ele também nunca deixa o lado bad-ass para trás. Ao saber que sua aluna é vítima de ciberbullying, Johnny se revolta e comenta que “na minha época, a gente fazia bullying olhando nos olhos da pessoa. Hoje se escondem atrás de um computador, são uns covardes”.

Embora baseado nos personagens e em uma história clássica dos anos 80, Cobra Kai traz a tona uma discussão atual sobre a busca do equilíbrio em uma época em que predomina uma cultura de radicalismo entre preto e branco, esquerda e direita, capitalismo ou comunismo, politicamente correto ou incorreto. Saber se impor, exigir respeito e ao mesmo tempo entender e respeitar o próximo e as diferenças é o grande desafio do mundo contemporâneo, algo muito mais complicado e difícil que vencer um torneio. Basta lembrar que escândalos sexuais já afetam a entrega do prêmio Nobel, desconstroem carreiras no cinema, medalhas olímpicas foram confiscadas por conta de comprovações de doping com conivência do governo russo, enfim, entramos de vez em uma era em que vencer a todo custo não é primordial. Os meios são mais importantes que os fins. Ao mesmo tempo, ainda precisamos nos impor, porque o mundo e nossa sociedade continua sendo implacável com os perdedores.



Agora é ficar na torcida para a série fazer sucesso e trazer novas temporadas. Porque ficou bem claro que a história entre Johnny e Daniel ainda tem muita coisa para nos ensinar e nos divertir.




sábado, dezembro 09, 2017

Westworld – A série (sem spoilers)




No desespero de tentar fazer um novo Game of Thrones, a HBO resolveu encurtar o verdadeiro Game of Thrones porque estava ficando muito caro e aí fez uma série mais cara ainda. Após a primeira temporada, a constatação do óbvio: Westworld não é Game of Thrones e deixou muita gente irritada com isso. No meu caso, fiquei irritado porque não havia necessidade de gastar grandes somas de dinheiro numa série que se destaca justamente pelas sutilezas e interpretações. Mas se essa grana toda foi investida a maior parte no elenco, a gente até perdoa, porque trata-se de dois pontos fortes de Westworld: elenco e roteiro.
Ironicamente, a surpresa agradável reside no fato de Westworld não ser Game of Thrones. Não se trata de uma imitação, de uma tentativa de repetir fórmulas parecidas. De fato, a única semelhança entre as duas séries é a profusão de “nudes” jogados na tela e que, honestamente, não atrapalha em nada a história, ao contrário, os nus fazem parte da atuação agora muito mais que em Game of Thrones. Temos peitos, bundas e pintos para todos os gostos. Se você é moralista aconselho a não ver nenhuma das duas séries e procurar uma igreja ou um mosteiro. Já vou avisando que há sexo nesses lugares também.
Fora isso, Westworld é pura ficção científica com pitadas de western. Baseado no filme de 1973 escrito e dirigido por Micheal Crichton que trazia a história de um parque que com três ambientes que simulavam épocas distintas: o velho oeste, a era medieval e a Roma antiga. Neste cenários, robôs incrivelmente realistas proporcionavam aos humanos o prazer de matar, roubar, estuprar e cometer os maiores atrocidades de maneira impune, uma espécie de GTA ao vivo. Tudo vai bem até que os robôs começam a bugar e querer matar os humanos sem razão aparente. Lembrando que o mesmo Micheal Crichton que, anos depois, escreveria o livro Jurassic Park que viraria o famoso filme de Steven Spielberg (roteiro também de Crichton) e que também fala de um parque aonde as atrações se voltam contra os visitantes.
Já a série foca apenas (ao menos nessa primeira temporada) no mundo do velho oeste. Já em relação à psique dos personagens, ela vai mais fundo e, claramente, escolhe o lado dos robôs. Assim, ficamos conhecendo Dolores (Evan Rachel Wood), uma bela jovem que vive intrigada com sua própria realidade. Ela busca uma postura otimista na vida enquanto é ocasionalmente morta e/ou estuprada. Sua narrativa regular envolve presenciar a morte de seu pai e sua mãe, só para ser salva por um “hospede” humano que quer viver a experiência de ser o mocinho da história e salvar a bela em perigo.
Nem todos os hóspedes, porém, querem ser mocinhos. A grande vantagem do lugar é justamente ficar livre de limitações morais. Imagine um lugar em que todas as pessoas que fazem comentários anônimos em sites de notícia pudessem fazer tudo que postam? Pois é... Assim, conhecemos o frio e sinistro homem de preto (Ed Harris) que está a mais de 30 anos jogando regularmente no parque e que tem uma queda para cometer atrocidades com mulheres, crianças e qualquer coisa que cruze o seu caminho.
A exemplo do Doutor Hammond de Jurassic Park, temos o Doutor Robert Ford (Antony Hopkins)como o dono e diretor do parque com ideias muito próprias sobre suas criaturas e umas intriguinhas entre a equipe e a diretoria. Temos também a figura de Bernard (Jeffrey Wright) como o segundo em comando. Um homem que parece compensar as perdas pessoais de um filho morto no passado com um apego especial aos robôs como se esses fossem seus novos filhos.
Como toda boa série, temos várias histórias paralelas, desde a dupla de novos hóspedes, o inocente Willian (Jimmi Simpson) e seu cunhado babaca, Logan (Ben Barnes). A robô prostituta (Thandie Newton) e o bandidão local Hector Escaton (Rodrigo Santoro) sempre querendo infernizar a cidadezinha local para roubar um cofre.
Como eu não sou exatamente um apaixonado por filmes do velho oeste, não consigo imaginar alguém pagando para viver nesse mundo. Aliás, tenho sérias dúvidas se iria caso me pagassem. E mesmo se houvessem na série cenários medievais e romanos como no filme, por mais que goste de história, tenho horror a banho frio. Então, parte da motivação da coisa para mim já é fraca. Há certos mistérios dentro de mistérios na série que incomodam por lembrar da má resolução de Lost, série que eu gostei muito mas, como a maioria dos seres humanos que a assistiram, não agradei do final. Westworld de fato abusa dos chamados mistérios não resolvidos, por exemplo, nunca fica claro como controlam um lugar tão gigantesco com tantas narrativas simultâneas e como técnicos e diretores fazem para chegar tão rápido em toda parte. O sistema de segurança dos parques de Micheal Crichton também são uma droga e seus funcionários não passariam um psicotécnico da Petrobras.
Dito isso, vamos a parte boa. Há uma ousada narrativa não linear que é diferente dos flashbacks e flashfowards de Lost e isso contribui para que fiquemos sempre com um pé atrás sobre o que está realmente acontecendo.
As discussões que a série se propõe sobre o que é identidade, o que é consciência, o que é estar vivo, renderão pano para muito estudos de narrativas num futuro bem próximo. As interpretações são impecáveis. Antony Hopkins não sai muito do padrão Hanibal Lecter, mas o fato é que ter um parque de robôs dirigido por Hanibal Lecter é realmente uma ideia sinistramente interessante. Rodrigo Santoro faz bonito como o robô estilo clichê de mexicano bandoleiro, só que charmoso. Jeffrey Wright está excelente como Bernard, mas as melhores chances de ganhar muitos prêmios estão com a dupla feminina Thandie Newton e Evan Rachel Wood. Ambas são robôs que vão aos poucos tomando consciência de sua própria natureza, cada uma a seu jeito e cada uma reagindo a sua maneira. Além da soberba interpretação de máquinas divididas entre a crescente consciência e questionamentos sobre suas identidades, também há momentos em que o lado “mecânico” toma conta e uma crise de choro pode ser bruscamente interrompida por um comando de voz. 
A atuação delas é literalmente visceral. Thandie Newton aparece em 40% de todas as suas cenas totalmente nua. Ao mesmo tempo em que chama a atenção para o belo corpo, também não deixa de mostrar com as rugas e os seios digamos não tão firmes aos 44 anos, a bela atriz mostra a decadência do que seria uma prostituta em final de carreira, desencantada com a vida, podemos sentir a dor que ela carrega de suas muitas vidas e, ao mesmo tempo, a força de uma máquina que se descobre superior aos seus criadores. Assim, quando a vemos nua em uma sala, atuando com dois homens vestidos, é impressionante como fica claro que a vulnerabilidade é toda dos homens e não dela.
Já Evan Rachel Wood às vezes é mostrada quase como uma estátua ou uma pintura. E quando o inocente Willian começa a se apaixonar por ela, parte de nós se apaixona junto.
Enfim, o grande trunfo de Westworld está no roteiro bem amarrado, infelizmente, isso só dá para saber com certeza vendo todos os episódios - e mais de uma vez. Talvez isso seja pedir demais para uma plateia, talvez não. Mas o fato é que se trata de uma série inteligente que buscou uma personalidade própria ao invés de tentar ser um Game of Thrones no oeste. Talvez falte um personagem para a gente torcer como Tyrion Lennister, ou um vilão que a gente queira morto como Joefrey. Não há um grande perigo como os caminhantes brancos ou uma grande batalha a ser travada, mas Westworld tem reflexões sobre a natureza humana que chegam em boa hora nesse mundo parece se deparar com uma encruzilhada aonde quem posava de mocinho não convence mais ninguém, deixando espaço para as caricaturas populistas de Putin, Trump, Maduro ou Bolsonaro que oferecem descaradamente fantasias infantilizadas. É uma série que, no final das contas, faz pensar em uma época em que precisamos realmente pensar e questionar a realidade em que vivemos.

segunda-feira, abril 17, 2017

A Bela e a Fera




Nova versão live-action de clássico da Disney é burocrática, mas agrada fãs do original

O sucesso do desenho animado A Bela e a Fera de 1991 foi tanto que gerou também um musical na Broadway, avenida de Nova Iorque em que ficam os teatros mais badalados dos EUA. A peça atraiu multidões e ficou em cartaz de 1994 até 2007. Agora, com o sucesso de outras versões com atores reais de desenhos da Disney, como Malévola e Cinderela, era inevitável que A Bela e a Fera também ganhasse sua versão live-action. Porém, muitos não perceberam é que essa versão é muito mais influenciada pelo musical da Broadway que propriamente pelo desenho animado. Por isso, quem for ver, se prepare para uma quantidade bem maior de números musicais e canções que o desenho animado.

Baseado em um conto francês, escrito por Gabrielle-Suzanne Barbot, Dama de Villeneuve, em 1740, conta a história de uma moça que, para salvar o pai, acusado de ladrão, aceita ser prisioneira de um monstro que na verdade é um príncipe amaldiçoado. No filme de 1991, assim como nessa nova versão, sobra maldição para os empregados do príncipe também que acabam se transformando em parte da mobília, da prataria e até da louça do castelo. Também como na versão em desenho animado, a maldição só será quebrada se o monstro conseguir amar e ser amado. E isso tem que ocorrer antes que uma rosa mágica perca totalmente as pétalas.

Protagonizado pela eterna Hermione de Harry Potter, Emma Watson, o filme ainda tem vários atores famosos fazendo as vozes dos empregados transformados. Assim, Ewan McGregor, o Obi Wan de Star Wars, faz o castiçal Lumiere, enquanto Ian McKellen, (Magneto e Gandalf) faz o relógio Cogsworth. Quem rouba o show é Luke Evans como mal caráter Gaston que está hilário como o ótimo vilão que toda boa história merece.

O filme, porém, é irregular, embora cumpra o papel de divertir especialmente quem é fã do desenho original. Várias partes do desenho são reproduzidas de forma idêntica, principalmente a icônica cena da dança, com Emma Thompson substituindo a lendária Angela Lansbury cantando a música tema que, inclusive, ganhou o Oscar em 1992. Há momentos belíssimos para arrancar suor dos olhos mais insensíveis. Mas eu confesso que chegou um momento que eu que pensei comigo: “Ah, não, vou ter que aturar mais uma canção!”. A maioria das músicas que não estavam no desenho são bem chatinhas. O maior defeito, entretanto, fica por conta dos efeitos digitais da Fera que, por problemas da produção, tiveram que ser refeitos às pressas. O plano original era que o ator Dan Stevens, o Matthew da série Downton Abbey, usasse maquiagem, mas a ideia não funcionou. Com a bilheteria chegando aos 500 milhões de dólares pelo mundo, entretanto, é fácil atestar que o filme herdou o charme, a simpatia e os dólares do agora clássico desenho de 1991.

Burocracia e polêmica

Atender as demandas do politicamente correto é sempre um desafio para a criatividade dos roteiristas, bem como a chance de atualizar uma história centenária sem que ela perca sua essência. No caso, trata-se de “Um conto tão antigo como o tempo” segundo a letra original da consagrada canção. A história fala de uma mulher presa por uma fera e que acaba se apaixonando por ela. Algo que há 300 anos, em um continente em que saber ler e escrever era privilégio de poucos, o casamento era algo arranjado por interesse e a noção de romantismo tinha mais a ver com a cultura muçulmana que com a europeia, era fácil de aceitar como uma bela história de amor.

Mesmo o desenho de 1991 foi alvo de críticas pesadas, a mais famosa na também animação Shrek de 2001, quando a princesa Fiona ao ser livrada do feitiço, faz o contrário do que acontece em A Bela e a Fera e assume definitivamente a forma de ogro, ou seja, ser feio ou mesmo monstruoso não precisa necessariamente ser uma maldição e você pode ser aceito  e ser amado sem precisar ser um modelo de beleza. O filme agora tenta contornar isso mostrando que a maldição foi desencadeada por uma bruxa exatamente porque o príncipe se recusou a ver a beleza interior.

A inclusão de negros no filme também causou polêmica. Houve protestos de alguns defensores do “historicamente correto” que não são necessariamente estudantes de história, ou saberiam que já havia muitos negros na França na época em que a história se passa, ou mesmo na época em que o conto foi escrito. Basta lembrar que o consagrado autor Alexandre Dumas, criador de Os Três Mosqueteiros, é negro e nasceu em 1802. Então, a inclusão de negros não é nenhuma grande ousadia, apenas uma correção. Já o personagem gay é tão caricato e paradoxalmente discreto que chega a decepcionar quem esperava algo mais ousado.

Finalmente, sobre a síndrome de Estocolmo, em que a prisioneira se apaixona por seu carcereiro, o filme usa a solução do conto, ou seja, a Bela só se apaixona pela Fera no momento em que esta lhe concede a liberdade de escolha. Entretanto, a rapidez com que a personagem de Emma Watson vai se interessando pelo monstro na medida em que vai passeando pelo castelo e descobrindo que ele tem uma biblioteca gigantesca, objetos mágicos e belos jardins, deixa a impressão que o filme não defende exatamente beleza interior, mas que você pode conquistar uma bela menina mesmo sendo feio, desde que você seja rico.