quinta-feira, março 26, 2009

Onde os fracos não têm vez

Vencedor do melhor filme de 2008 é um dos mais sinistros de todos os tempos

Um caçador de cervos chamado Llewelyn Moss (Josh Brolin) está no deserto quando descobre uma chacina. Corpos espalhados pelo chão são indícios de uma verdadeira guerra entre traficantes que acabou com praticamente todo mundo morto. Ele conclui que, se houve briga, deve haver dinheiro em algum lugar próximo. Como nos melhores filmes de terror, o personagem não se conforma em apenas pegar o dinheiro e sumir. Ele resolve voltar à noite (sempre à noite) na cena do crime só para dar pistas para os donos do dinheiro poderem caçá-lo.
E eles não vão mandar qualquer um. Pois para recuperar uma maleta cheia de dinheiro da qual não se quer muita publicidade, a melhor coisa é colocar um serial killer chamado Anton Chigurh, um matador psicopata interpretado pelo espanhol Javier Bardem que faz Jason Vorges parecer um escoteiro. No meio de tudo está um xerife interpretado por Tommy Lee Jones que está mais interessado em contar “causos” escabrosos do que deter o assassino.
A perseguição entre os dois vai deixar um rastro de sangue em toda parte, porque Chigurh não pensa duas vezes antes de mandar alguém fazer geologia nas terras celestiais.
Com essa premissa absurda, se constrói um dos filmes mais realistas dos últimos tempos. Quem já teve a oportunidade de acompanhar de perto o trabalho da polícia, sabe que não há nada de irreal na sede de sangue de Chigurh.
Adaptação do livro de Cormac McCarthy, “Onde os Fracos não têm vez” é a obra que consagrou os irmãos Ethan e Joel Coen que normalmente fazem filmes engraçados, embora carregados de certa amargura que sempre caía bem com alguns elementos líricos que permeavam seus filmes. Desta vez o lirismo deu lugar ao mítico. Chigurh é uma encarnação de tudo o que há de ruim do ser humano. Feito com competência hipnótica por Javier Bardem, o personagem já começa mostrando a que veio nos primeiros momentos em cena, quando mata o policial com uma expressão quase pornográfica no rosto. Com voz pausada, grave e sempre com uma postura controlada, ele lembra realmente o “astro” da série Sexta-feira 13, que nunca precisava correr para pegar suas vítimas (parece que isso vai mudar agora com a nova versão). Parte do terror está justamente na frieza em relação as suas vítimas, chegando a usar como ferramenta um dispositivo de ar comprimido para abater gado, como se suas vítimas não fossem nada mais que animais a serem abatidos.
Por outro lado, Josh Brolin, compõe o arquétipo de um homem ordinário, sem grandes virtudes, mas também sem grandes defeitos. O que se vê na tela pode ser interpretado como uma projeção da fragilidade do ser humano perante a sua própria natureza. Neste aspecto, a história guarda elementos comuns com Moby Dick, talvez a maior obra do gênero. Se o livro de Herman Meilville é o capitão que persegue o monstro indestrutível representado pela baleia, aqui é o monstro que persegue implacavelmente Llewelyn Moss que se mostra terrivelmente incompetente para fazer algo além de fugir.
No final anti-climax, vemos apenas o resultado da batalha, seguido por uma narrativa metafórica do xerife que sonha com coisas boas, mas de repente acorda e vê que está no mundo real, onde os fracos não têm vez.

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