Produto nacional com gostinho de quero mais
Bacurau é um filme original. Além da rima, essa verdade cria
um problema de expectativa. A única inspiração que ficou clara para mim foi o
filme O Alvo (Hard Target, 1993) com Jean Claude Van Dame e que aposto que
ninguém mais lembra. Embora também tenha me feito lembrar o Ju-on (2002), o Grito,
original japonês, porque, ao contrário da adaptação norte-americana, o original
japonês tem como personagem principal a casa e não um protagonista específico.
Aqui, é a mesma coisa. O personagem principal de Bacurau é... Bacurau, formada
por seus excêntricos e normais habitantes.
O roteiro e a direção não têm pressa de nos apresentar a
cidade e seus moradores para depois começar a mexer as peças do xadrez. O filme
mistura muita, mas muita crítica social com uma violência exacerbada, nudez e
uma sensação de nunca saber direito para onde o roteiro está indo, o que é
ótimo. E quando achamos que conhecemos aquele mundo, o roteiro vai nos dando uns
nós e uns “WTF?” que nos deixam desorientados e cada vez mais curiosos.
Termina o filme e temos a sensação de ter ido além de um
filme, mas uma experiência. Bacurau é para ser experimentado, para ser vivido,
sem pudor, sem vergonha e sem culpa, como fazem os habitantes da cidade.
Para deixar a coisa ainda mais original e mais “WTF?”, trata-se
de uma ficção científica assumida, embora num futuro que pareça não ser tão distante
e nem tão improvável e pelo fato de que a história poderia se passar tanto
hoje, quanto uns 40, 70 anos atrás, afinal, o Brasil sempre foi assim. A ficção
científica entra no recheio da crítica social deixando o filme cheio de camadas
para você ficar pensando depois. Mas é bom repetir, a gente vai sempre concluir
que o Brasil sempre foi assim, como é retratado em Bacurau.
Agora, a expectativa estraga um pouco. Porque elogios demais
e a nossa ligação de intimidade com os filmes de ação de Hollywood cobram um
pouco demais do filme. No manual do roteiro hollywoodiano, Bacurau teria menos
10 minutos apresentando a cidade a mais 10 minutos no seu ato final, com um
pouco mais de tensão. Não sei se foi de propósito, mas deixou um gosto de quero
mais.
Coincidentemente, o filme e seu contexto deixam ganchos para
uma continuação. Afinal, que mundo é aquele? Que Brasil é aquele de Bacurau, tão
real e tão fantástico?
Para esse povo chato que reclama de excesso de filmes de
super-heróis e da Fórmula Marvel, como se fosse obra do diabo, que vá então ver
Bacurau. Só não espere um filme de super-heróis e com a Fórmula Marvel. Bacurau
é original. Não crie expectativas, apenas abra a boca e prove.
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