segunda-feira, abril 22, 2019

Han Solo – Uma história de Star Wars


Filme Solo de Han Solo se esforça e consegue ser o primeiro grande fracasso de público e crítica de Star Wars depois de 40 anos




O jovem Han (Alden Ehrenreich ) foge de seu planeta natal, Corelia, mas não consegue levar a namoradinha, Kira (Emilia Clarke) e ela é presa pelo Império. Para salvar a própria pele, ele ainda tem que se alistar no mesmo Império Galáctico. Três anos depois, com a ajuda de um novo amigo, Chewbacca, consegue se juntar a uma gangue de trapaceiros golpistas comandada por Beckett (Woody Harrelson) e copiada da turma do Dominic Toretto de Velozes e Furiosos. Daí, eles tentam um golpe estilo Torreto que não dá certo. Agora eles têm que prestar contas ao contratante.  Acontece que o contratante também é o chefe de quem? Kira!  Ah, sim! Por um acaso do roteiro, Kira, agora é o braço direito justamente do cara que contrata regularmente os serviços desta  gangue. Sim, Campeão, tu perdia sua mãe no supermercado, mas o Han Solo, no meio de uma galáxia inteira, dá de cara com Kira por mera coincidência. Afinal, uma galáxia é um lugar pequeno...

O roteiro vai ficando confuso. Porque Kira é para ser misteriosa e por isso, ela tem várias oportunidades de explicar para Han quem ela era agora. Mas ela prefere ficar fazendo cara de misteriosa. Afinal, o roteiro precisa que ela seja misteriosa.

Aí, ela vai junto numa missão arriscada para que eles paguem o que devem ao grande vilão, interpretado por Paul Bettany. Depois descobrimos que ela não precisava ir. Porque o roteiro dá a entender depois  que ela é a segunda no comando. Não precisava sujar as mãos. Mas ela também é escrava do vilão, embora, fique claro que ela podia dar uma surra nele na hora que quisesse e assumir seu lugar. Por que não fez antes?  Porque o roteiro quis assim. Mas tudo bem, voltemos à missão.

 Para executar a missão, eles precisam de uma nave rápida e encontram Lando Calríssian, uma ótima presença de Donald Glover. O plano de Han é ganhar a nave de Lando, o poderoso Millenium Falcon num jogo de Sabacc. Novamente o plano não dá certo, mas Lando resolve ir junto também na arriscada missão impossível do grupo porque... O roteiro diz que sim e lá vamos nós numa aventura interessante e divertida, mas que, na maioria das vezes, você precisa esquecer a lógica para curtir.



Rever um ano depois



Desapontado com o filme. Encontrei um grupo de fãs recentemente que disse ter adorado. Bom, gosto não se discute. Mas pensei comigo. Vai que eu me enganei? Posso ter criado expectativas. Assim, um ano depois, resolvi rever o famigerado mega fracasso da Disney e primeiro filme de Star Wars a dar prejuízo em todos os tempos.

O resultado? Bom, achei bem pior agora, olhando friamente, do que um ano atrás. Vamos às impressões.



A jornada do roteiro de um filme

Logo no começo do filme, uma coisa já começa a incomodar. Todo professor de roteiro, seja ele de tevê, cinema, teatro, ou mesmo de um livro, vai dizer a mesma coisa: “É muito melhor mostrar do que dizer”. Tem horas que não dá para fugir do diálogo expositivo, claro. Mas a motivação do personagem é uma peça fundamental de toda obra impactante. Por isso é estranho, muito estranho, que um roteiro feito pelo grande mestre Lawrence Kasdan e seu filho Jonathan Kasdan, prefira colocar o jovem Han Solo repetindo várias vezes que quer ser um grande piloto, sem nunca mostrar uma real motivação. Uma cena de Solo admirando uma nave ou coisa parecida já servia. Confesso que fiquei com uma curiosidade que não tinha. Por que diabos ele quer tanto ser piloto?

Ou seja, se o filme responde perguntas que os fãs não queriam respostas. Ele ainda coloca mais perguntas na cabeça da gente  e não dá respostas.

Uma fanfic do escritor brasileiro da ficção científica, Jorge Calife, sobre Wedge Antilles, um dos venerados personagens secundários da trilogia clássica de Star Wars, vivido por Denis Lawson, mostra de forma sutil e poética, como o jovem Wedge quando menino entrou clandestino em um cargueiro e ficou fascinado com as viagens espaciais, antes de ser pego. Neste singelo exercício de imaginação, Calife nos mostra como seria a motivação da carreira do único piloto a participar ativamente da destruição das duas estrelas da morte. Se filmada, possivelmente não duraria nem 5 minutos na tela e seria deliciosa de ver.

Mas o filme de Han Solo não está nem aí para sutilezas. A melhor palavra que pensei para definir o roteiro é desengonçado. E as confusões nos bastidores não nos deixa saber até onde a direção do irregular Ron Howard conseguiu ajudar ou atrapalhar. O fato é que o excesso de tentativas de reviravoltas prejudica, porque não são realmente interessantes e chegam a cansar.

Para não dizer que não tem nada de bom no roteiro, o fato é que há uma profusão de fan-service jogados na tela o tempo todo e isso é realmente divertido. Talvez seja isso que agradou a alguns fãs. Eu também gostei.

Mas aí, a parte mais corajosa de tentar responder perguntas que os fãs não fizeram e que seria o ponto alto do filme caso se desse certo.  Mas não deu.



A grande aposta da produção



Muitos vão dizer que Solo foi uma aposta arriscada ao mexer com um personagem icônico. Entretanto, por mais que houvesse pirraça dos fãs antes da produção, o fato é que todo fã queria mesmo um bom filme do personagem. Star Wars está no manual de qualquer professor de roteiro e nele você sempre vai achar uma citação a Han Solo, pois ele é a cristalização do conceito de amigo do herói que dá a liberdade ao escritor ou roteirista de criar sem as amarras do herói. Han Solo não precisa ser nobre, não precisa ser sábio, nem gentil, nem educado. Por isso mesmo, é um personagem mais livre que Luke. Algumas “imitações” de Han Solo fizeram história. Basta lembrar o caso de Jack Sparrow, em Piratas do Caribe, que era o Han Solo de Will Turner e acabou roubando a franquia inteira. Para muitos fãs, Han Solo era mais popular que Luke. Tanto que o ator Harrisson Ford virou astro supremo de Hollywood, enquanto Mark Hamill ficou quase na obscuridade, apesar do talento que revelou no teatro e como dublador.

Aliás, a imagem de Harrisson Ford, o maior astro das décadas de 80 e 90, também assombrava a produção. Então, não se tratava apenas de arrumar um novo Han Solo, precisavam sair da sombra de Harrisson Ford. Tarefa nada fácil.

Como o cara que mais se apresentava como o “herdeiro” de Ford, Chris Pratt já estava atarefado, tiveram que arrumar um genérico.

Alden Ehrenreich começa com um grande problema de nove centímetros... Calma, estou falando da altura dele.  Ele tem 1,76 de altura. É mais baixo que eu. Ford tem 1,85. (Só de curiosidade, Pratt 1,88)

Já que vai ter que apelar para a suspenção de descrença do público. Tiveram uma ideia que eu achei ótima. Vamos continuar seguindo a linha da Marvel e seu MCU, ou seja, chamar diretores diferentes para os filmes, dando liberdade para colocar seu toque pessoal. Chamaram os caras que fizeram Anjos da Lei, Phil Lord, Christopher Miller. Os caras pretendiam fazer uma mistura de aventura e comédia.

Achei uma boa ideia. Han e Lando fazendo uma “dupla do barulho”. Realmente há várias situações no produto final que parecem puxar para o lado da comédia, mas como resolveram ser sérios, a coisa ficou esquisita. O exemplo é o encontro entre Han e Chewei. Que parece pensado como piada.

 Quando pegam a robô militante pelos “direitos dos robôs” e enfiam seus restos mortais na Falcon, parece ser outro caso de uma cena foi pensada como uma atitude maluca que seria engraçada em Anjos da Lei, mas ali, ficou parecendo apenas que Lando teve um luto de 5 minutos e depois usou o cadáver da amada para consertar um computador. Ficou até uma cena de mau gosto, que talvez funcionasse numa comédia de humor negro.

Não sei o que se passou no set de filmagem. Sei apenas que houve conflito entre o ator e os diretores e a Kethleen Kennedy, a produtora, entrou na briga. Chamou outro diretor, Ron Roward para consertar. Roward veio com a marra de quem já tem um Oscar na prateleira e de já ser “de casa”. Mas é um diretor irregular.

Hoje é impossível dizer se o filme de Phil Lord e Christopher Miller seria melhor. Mas não custa lembrar que Phil Lord ganhou um Oscar este ano porque produziu e escreveu um tal de Homem-Aranha no Aranhaverso. Bom, o leite já tá derramado, né?

Já havia acontecido coisa parecida em Rogue One, com Kethleen Kennedy entrando de sola e mandando modificar o filme, mas o resultado parece que foi ótimo. Ao menos eu adorei o filme e ele fez grana pracaramba.



No final, o roteiro de Lawrence Kasdan e filho, não foge da proposta desafiadora, que era responder as perguntas que ninguém queria que respondessem. O problema é que as respostas são ruins. Por exemplo:

1.       De onde veio o nome Solo?

Resposta: era o sobrenome do cara, ponto. Quem quer saber isso?

Resposta do filme: um maluco precisa preencher um formulário com o sobrenome do Han e ele não tem sobrenome. “Ah, você é sozinho? Então vou escrever Solo”. Funcionaria numa comédia? Talvez... Fiquei com a impressão que o roteiro foi pensado como uma comédia mas foi refilmado por Ron Roward de outra forma.

Para os fãs da saga, a coisa fica mais esquisita. Pois, fica claro que, Han e a princesa Leia tiveram um filho e resolveram batizá-lo com dois nomes falsos: Ben e Solo!

Para quem não sabe, Ben, era o nome falso adotado por Obi Wan Kenobi no primeiro filme Star Wars.

2.       O que era a Corrida de Kessel?

Resposta: vários fãs, incluindo cientistas tentaram responder essa questão. Afinal, Lucas usa parsec, uma medida de distância, como se fosse uma medida de tempo. Então, a maior expectativa em relação ao  filme de muitos fãs mais ligados a ficção científica, era como seria resolvida essa questão?

Resposta do filme: aproveitaram a deixa dos fãs e realmente colocaram que o grande lance da Milleniun Falcon era o poder de processamento do computador e não a velocidade da nave. Algo que realmente faz sentido do ponto de vista científico. Mas fizeram da rota de Kessel algo nebuloso (trocadilho involuntário pois ela se passa numa nebulosa) e não há por que alguém dizer que a nave ficou famosa por conta disso. Não foi uma corrida, ninguém viu. Foi um roubo. Se foi um roubo, Han já seria um cara muito mais procurado na galáxia, caso ficasse famoso. Ou seja, nada faz muito sentido.

3.       Por que a Milleniun Falcom é tão rápida?

Resposta: ninguém quer saber

Resposta do filme: havia um robô L3-37 com grande capacidade de processamento. Esse robô sonhava com direitos iguais, achava que os droids precisavam ter liberdade como os humanos. E mantinha uma relação platônica com Lando.  Quando o robô morre, Lando e Han pegam o processador dela, praticamente a alma do robô e integram a espaçonave. Deixando um robô, que sonhava com liberdade, eternamente escravizado numa nave. Sim, a Milleniun Falcon não é mais a nave símbolo da luta pela liberdade. É um aparelho que tortura eternamente uma criatura. Star Wars fazendo piada com tortura? Sério?

Enfim, o fato é que, com decisões infelizes e um roteiro atrapalhado, Han Solo decretou de vez que os estúdios Disney fariam uma pausa (um hiato) após o Episódio 9 para poder pensar as coisas direito antes de executar. Para isso o filme serviu.

Tem algo que se salva?

Se você não tem o hábito de pensar se a história faz sentido ou não, talvez você curta. Há muitos filmes assim.

Alden Ehrenreich e Donald Glover mostram competência em seus personagens. Pena que a dinâmica entre os dois é mal aproveitada. A grande surpresa boa do filme é justamente a participação mais efetiva de Chewbacca que até então era um dos personagens mais mal aproveitados na saga.

O filme tem um ponto em que realmente decola, principalmente na tão falada rota de Kessel, mas depois o ritmo volta a variar e a necessidade de enfiar viradas no roteiro acaba cansando. O roteiro telegrafa várias vezes que alguém vai trair Han Solo.

 As duas grandes viradas são feitas por motivações vazias. Dois personagens traem Han Solo porque o roteiro precisa ou assim o quer. Não havia motivos sólidos para as traições. E se havia, ambos os personagens claramente gostavam de Han e gostavam muito. E ambos tiveram tempo para que, se quisessem, conversar com Han. Mas o roteiro...

E Han tem um arco de virar um bom moço exatamente igual ao de Uma Nova Esperança. Ou seja, ele sempre foi bom moço. Segundo este filme, o que se viu em Uma Nova Esperança era falso? Não, na verdade, parece que o filme foi pensado como o primeiro de uma série de filmes do Han Solo, ou talvez emendando com outro filme sobre o Lando. Como não aconteceram, muita coisa ficou no ar. Muitos ganchos que provavelmente nunca vão ser conectados.

E é inegável que o fracasso de crítica e o desânimo dos fãs com o esquisito The Last Jedi ajudou a espantar parte do público, mas o fracasso de Han Solo é mérito próprio. O primeiro Star Wars a dar prejuízo na história do cinema. Vamos torcer para que os produtores tenham aprendido a lição e demore pelo menos mais 40 anos para ter outro recorde negativo.


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